quinta-feira, dezembro 30, 2010

R.I.P. (WIP version)

Chegou atrasada, batendo o mat nos pés de duas pessoas que já estavam estendidas no chão. Pensou "namastê" e, por alguns segundos se sentiu ridícula e inadequada: sabia que não era pra falar assim... "namastê???", por que tinha comprado um mat pink, todos usavam tons pastéis. Queria pedir desculpas, queria fugir e nem era por causa de nada daquilo. Nada daquilo fazia parte.
Esticou o mat mesmo pink no canto abaixo da janela a ver se sumia na imensidão da grande sala, soltou os cabelos na tentativa de soltar a si mesma, sua tensão. De com o gesto deixar de ser quem era e passar a ser solta, equilibrada e quase flutuante.
Deitou-se de costas com as pernas esticadas e os braços ao longo do corpo. Devagar. Fechou os olhos sem apertá-los, sentiu como se pesássem na parede do crânio do outro lado da cabeça, como se pesássem sobre o chão. Soltou seu peso, parte por parte. Pedaço por pedaço. Músculo por músculo. Dedo por dedo.
Uma voz íntima e serena falou baixo próximo de seu ombro: "Ouça os sons de tudo, de perto e de longe, até que façam parte de você. Até que cessem." E como numa chuva que cai forte, mas não de repente, começoua ouvir.
Talvez uma ou duas pessoas não estivesse estáticas e moviam nitidamente a perna ou o braço bucando posição para relaxar. alguém pisava leve sobre o tatame de palha, como se pesasse 200g. Pisava e parava, pisava primeiro o calcanharm, o corpo da sola primeiro fora, depois dentro e depois os dedos e tudo ia saindo de novo lentamente desgrudando do chão e fazendo um estalado quase surdo que se misturava ao som de um avião que pousava no aeroporto lá fora, não muito longe e cujas turbinas se misturavam com o som do motor do carro que estava ligado e parado na rua. Uma música tocava uma batida que fazia apenas um zum zum abafato que tremia o vidro do carro.
O portão abriu, um oi, um obrigada e um qual o seu nome nervoso. Alguém tinha se apaixonado. o portão ficou aberto e a conversa continuou sem querer, sem esforço, sem palavras que se distinguisse. Um cachorro latiu longe e todos os sons continuavam sem nenhum chamar atenção, faziam parte.
Respirou mais forte, ouviu quando expirou, começava a fazer parte também. Ouvia o ar entrar e sair, arranhando de leve as paredes das narinas. Entre inspiraçao e expiração já não fazia nada, haviaum vácuo natural que deixava um espaço, tocando de leve, como se viesse de um poço fundo e ecoado, uma batida surda, e outra, e outra e mais uma. Ritmada, fixa, uniforme, leve. Era isso. Tudo havia cessado.
Relaxe, pensou. Relaxe. Só havia aquele som. Só ouvia aquele som. Até que não ouvia mais. Nada.